quinta-feira, 13 de julho de 2006

O vale

foto de Bob Wolfenson

Não sou eu quem cava esse enorme vale entre o que sou e o que quero ser. Ele me foi dado de presente ao nascer e centenas de almas, que não posso ver nem sentir, almas cegas e obedientes a não sei quem, cuidam diariamente para que se torne cada vez mais fundo e largo. Maldito vale que não vejo mas sinto crescendo diante de mim. Incansáveis almas que eu odeio mas que, sei, trabalham a mando de alguém que me ama. Ó, mistura maldita de amor e ódio. Ó criatura por trás de tudo, calada e paciente que se move devagarzinho e não me deixa em paz. Ó tortura cruel: mandar-te embora de vez e perder teu amor, ou continuar contigo ao meu lado e ser vítima de teu ódio?
Publicado opela primeira vez em 28/02/2004

Quem sou eu?


montagem feita por mim
Enganei-me eu e enganou-se quem disse que eu nunca chegaria a ser algo mais do que o fracasso que eu sempre fui. Pois eu sou eu e sou um monte de gente. Sou um pouco de todos que passaram pela minha vida. Sou os que me amaram, os que me odiaram e, principalmente, sou os que me desprezaram. Esses sinto que sou mais. Sou meus amigos mas também sou meus inimigos. Sou os que me lembro e os que deles me esqueci. Sou os que me visitam e os que já se foram. Sou tantos. Sou uma confusão de seres, de mins, de eles, de todos. Sou uma mistura indecifrável de outras misturas que, com outros, vieram já bem misturadas. Sou muito de todos e de tudo e sou menos de mim mesmo. Sou o acúmulo dos meus ontens, uma névoa do hoje e uma intenção do amanhã. Sou um nada repleto de tudo e um tudo que me leva a nada. Sou pouco do que seria ter sido eu mesmo, mas sou muito mais do que um dia chegaria a ser. Eu não sei quem sou, mas isso é compreensível visto que não sou ninguém, sou todos.
publicado pela primeira vem em 26/02/2004 - O engano